Sobre Financiamentos Coletivos
Estava dando uma revirada em anotações antigas, e encontrei esse comparativo abaixo. Eu tinha postado isso como um textão no meu perfil pessoal do Facebook lá em 2017, mas isso já se perdeu nas areias do tempo na rede do Markinho. Porém, dado que, nos últimos anos, muitos jogos de tabuleiro tem sido viabilizados através de financiamento coletivo (crowdfunding) e campanhas de pré-venda, acho interessante compartilhar a minha experiência nesse campo.
Pra contextualizar: em 2017, se tratava da 3ª campanha de fora do país que eu apoiava (quem prestar atenção nos detalhes vai deduzir quais foram as duas primeiras), e também a 3ª campanha nacional – ou seja, já deu pra entender melhor como esse modelo funcionava, e não tive o "azar de iniciante" (de ter entrado em apenas uma campanha e logo aquela ter dado grande problema).
As minhas conclusões estão no final, mas, fiquem livres pra tirar as suas...
FINANCIAMENTO COLETIVO DOS EUA (O mais recente do qual participei.) |
FINANCIAMENTO COLETIVO DO BRASIL: (O primeiro do qual participei após a conclusão desse à esquerda.) |
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Livro de RPG, edição comemorativa de 20 anos de um jogo já estabelecido desde 1995. | Jogo de tabuleiro, recente; reformulação de um jogo de miniaturas genuinamente nacional (não tradução de coisa estrangeira) já esgotado faz alguns anos. |
Na época da abertura da campanha, dizia o coordenador do projeto que o texto já estava completo, faltando só a "preparação" do livro propriamente dita. | Na época da abertura da campanha, o jogo já vinha sendo testado, reformulado e re-testado há vários meses. |
Livro: envolve escritores, revisores, ilustradores (sendo que uns 80% da arte era reciclada de livros anteriores), diagramadores, gráfica e distribuição. | Jogo de tabuleiro: envolve desenvolvedores, ilustradores (com trabalhos novos, nada de reciclagem), gráfica (com trabalhos de corte das peças e cartas bem mais elaborados que um livro), vários fornecedores externos de outros componentes do jogo (dados, peões, meeples, sleeves, inserts, etc., aquele tipo de coisa pequena que sempre corre o risco de vir a menos e tal), montagem e distribuição. |
Campanha iniciada em Março/2014, projeto financiado com sucesso em Abril/2014 (e pago em dólar). Previsão inicial de entrega em Março/2015. QUASE UM ANO – lembrem do texto já "completo" e da arte "reciclada" aí em cima. | Campanha iniciada em Março/2017, projeto financiado com sucesso em Maio/2017. Previsão inicial de entrega em Julho/2017. DOIS MESES. |
Durante a produção, contatos do coordenador do projeto meio que esporadicamente (chegando a quase 2 meses sem notícia, no intervalo mais longo), com detalhes meio superficiais, e só pelas mensagens do Kickstarter. | Durante a produção, contatos com o coordenador do projeto quase toda semana (no máximo a cada 2 semanas), com detalhes precisos, e o cara ainda criou grupo no Facebook e disponibilizou o e-mail particular dele pra tirar dúvidas, se fosse o caso. |
Livro enviado pela FedEx ("Ooohhh, FedEx!"), que se embananou no sistema, trocou alguns números de rastreamento, e o livro constava como já entregue na busca do site deles (inclusive com comprovante de recebimento ASSINADO e digitalizado), quando não tinha sido. Tive que ligar pro escritório local – não sem antes ter que fazer uma escavação nas profundezas do Google pra achar o número direto do escritório de Porto Alegre – pra tocar os cachorros e ver a cara do livro (que já estava em POA, ou seja, foi cagada de alguém daqui). Chegou em POA em 2 semanas (o que, vindo dos Estados Unidos, é até rápido), mais uma semana pra resolver a mancada do rastreamento deles; total 3 semanas. |
Jogo enviado pelos Correios ("Baaahhh, Correios??"), que já tem "aquela" fama entre os boardgamers. Entregue em 6 dias, sem enrolação (tudo bem que veio de SP, não do outro hemisfério, mas, né...), e completinho. |
Um dos extras era um "escudo de narrador" ('Storytellers Screen', basicamente um papelão dobrado com algumas tabelas e diagramas de referência), que na nota fiscal veio declarado como "GAME screen". UMA palavrinha miserável que me fez pagar quase R$ 100 de imposto, graças aos critérios super adequados da Receita Federal. | Custo extra: R$ 30 de frete (pra uma caixa monstro de quase 5kg). |
Entrega prevista inicialmente pra Março/2015, livro entregue de fato em Abril/2016. MAIS DE UM ANO DE ATRASO. | Entrega prevista inicialmente pra Julho/2017, jogo entregue de fato em Agosto/2017. MENOS DE 30 DIAS DE DIFERENÇA. |
Atraso que me fez desistir de apoiar as campanhas seguintes da mesma editora (foi o 3º projeto que apoiei), e também, até o momento, qualquer crowdfunding de fora do país. Tanto desanimou que revendi o livro ainda lacrado menos de uma semana depois de recebido. |
Terceiro projeto que apoio da mesma editora. Que venham as expansões. |
Campanha | Campanha |
Conclusões
- Não é porque o projeto é gringo que necessariamente vai ser um trabalho melhor executado.
- Conheça seus fornecedores e saiba planejar direito o seu projeto, com datas realistas – ou pelo menos sem querer abraçar o mundo em "delírios de produtividade".
- Atrasos sempre podem ocorrer, mas tudo tem limite.
- Não fique quase dois meses sem dar sinal de vida pros seus apoiadores. Isso irrita. MUITO.
- Declare direito os produtos na nota fiscal.
- As regras de tributação da Receita Federal são imbecis (mas acho que isso não é exatamente uma novidade...).
- Quando REALMENTE se quer fazer o negócio direito, sai direito.
Quando REALMENTE se quer fazer o negócio rápido, sai rápido.
É só organizar.
Independente do país.
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